Circunscrição : 1 - BRASILIA
Processo : 2005.01.1.072563-4
Vara : 202 - SEGUNDA VARA CIVEL
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Processo : 2005.01.1.072563-4
Ação : INDENIZACAO
Requerente : MONICA VALERO SINGH
Requerido : ADAUTO SILVA e outros
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Sentença
Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por MONICA VALERIO SINGH em face de ADAUTO SILVA, BARBARA DE B. G., BRUNO MUNIZ, DANÚBIA CRISTINA, GABRIELA DE LIMA, ISA CARDOSO, JOÃO PAULO, LIVIO BARBOSA, MARIA LUIZA PONTES, MARIANA GASPAR, MARIANA VIDAL, PEDRO VINÍCIUS, POLLYANA SOUSA, RAFAEL ANTÔNIO, RAFAEL FERNANDES, SABRINA ARAÚJO e SOFIA JOSÉ. Narra a inicial que a autora, professora adjunta da cadeira de Tecnologia Farmacêutica da Universidade de Brasília, assumiu a turma do 7.º semestre, da qual fazem parte os requeridos, no início do ano letivo de 2005. Ao fim do semestre, os requeridos realizaram uma manifestação contra inúmeros professores, dentre eles a autora, consistente na publicação de declaração escrita nos corredores da Faculdade de Farmácia da Universidade de Brasília (fls. 07/11). A autora ressalta a inveracidade do documento, bem assim o seu caráter abusivo e desrespeitoso. Assevera que, ao tomar conhecimento do fato, junto com a Coordenação do Curso, pediu a adoção de providências à Vice-Reitoria da UnB, que abriu procedimento administrativo. Aduz que os mesmos alunos que publicaram o manifesto, em 10 de março de 2005, encaminharam nota de desagravo em que reconheceram que "o modo como foi escrito, algumas vezes ofensivo e pejorativo, não foi o mais adequado" (fl. 15). Sustenta a má-fé dos requeridos, que cria o dever de indenizar pelos danos morais causados à autora. Cita jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e doutrina em favor de sua tese. Pede a condenação dos réus no pagamento de indenização por danos morais no valor de 40 (quarenta) salários mínimos. Junta aos autos os documentos de folhas 06-22.
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Em 24/08/2005, com base no art. 284 do CPC, este juízo determinou à autora que emendasse a inicial a fim de preencher os requisitos elencados nos arts. 282 e 283 do Código de Ritos.
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Em 29/09/2005, a autora emendou a inicial, nos termos da petição de fls. 26/17, requerendo a condenação dos requeridos ao pagamento de indenização no valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais), acrescido das custas processuais, juros de mora, correção monetária e honorários advocatícios, fixados em 20% do valor da causa (fls. 26/27).Processo : 2005.01.1.072563-4
Vara : 202 - SEGUNDA VARA CIVEL
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Processo : 2005.01.1.072563-4
Ação : INDENIZACAO
Requerente : MONICA VALERO SINGH
Requerido : ADAUTO SILVA e outros
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Sentença
Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por MONICA VALERIO SINGH em face de ADAUTO SILVA, BARBARA DE B. G., BRUNO MUNIZ, DANÚBIA CRISTINA, GABRIELA DE LIMA, ISA CARDOSO, JOÃO PAULO, LIVIO BARBOSA, MARIA LUIZA PONTES, MARIANA GASPAR, MARIANA VIDAL, PEDRO VINÍCIUS, POLLYANA SOUSA, RAFAEL ANTÔNIO, RAFAEL FERNANDES, SABRINA ARAÚJO e SOFIA JOSÉ. Narra a inicial que a autora, professora adjunta da cadeira de Tecnologia Farmacêutica da Universidade de Brasília, assumiu a turma do 7.º semestre, da qual fazem parte os requeridos, no início do ano letivo de 2005. Ao fim do semestre, os requeridos realizaram uma manifestação contra inúmeros professores, dentre eles a autora, consistente na publicação de declaração escrita nos corredores da Faculdade de Farmácia da Universidade de Brasília (fls. 07/11). A autora ressalta a inveracidade do documento, bem assim o seu caráter abusivo e desrespeitoso. Assevera que, ao tomar conhecimento do fato, junto com a Coordenação do Curso, pediu a adoção de providências à Vice-Reitoria da UnB, que abriu procedimento administrativo. Aduz que os mesmos alunos que publicaram o manifesto, em 10 de março de 2005, encaminharam nota de desagravo em que reconheceram que "o modo como foi escrito, algumas vezes ofensivo e pejorativo, não foi o mais adequado" (fl. 15). Sustenta a má-fé dos requeridos, que cria o dever de indenizar pelos danos morais causados à autora. Cita jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e doutrina em favor de sua tese. Pede a condenação dos réus no pagamento de indenização por danos morais no valor de 40 (quarenta) salários mínimos. Junta aos autos os documentos de folhas 06-22.
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Em 24/08/2005, com base no art. 284 do CPC, este juízo determinou à autora que emendasse a inicial a fim de preencher os requisitos elencados nos arts. 282 e 283 do Código de Ritos.
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Em 29/11/2005, a emenda foi acolhida, determinando-se, ainda, o trâmite do feito pelo rito comum sumário, a designação de data para a audiência prevista nos arts. 277 e 278 do CPC e a citação e intimação dos requeridos, nos termos da decisão de fl. 29.
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Tendo em vista a quantidade de réus, a audiência de conciliação foi cancelada e o rito transformado em ordinário. Foi, ainda, determinada a intimação dos réus citados para apresentação de resposta no prazo de 15 dias, nos termos da decisão de fl. 115.
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Em 17/10/2007, os requeridos apresentaram sua defesa, por meio da petição de fls. 118/124. Infirmaram a alegação da autora de que o manifesto seria afrontoso a sua dignidade, nos seguintes termos: "no manifesto, em nenhum momento foi tecido qualquer comentário à pessoa da Requerente Sra. Mônica Valério, mas sim sobre a didática, sobre os serviços prestados pela referida professora, estando os Requeridos na situação de consumidores dos serviços por ela prestados, tornam-se justos os comentários oferidos" (sic). Alegaram, ainda, que não foi apontado o dano, que seria futuro, segundo a própria inicial. Aduziram, por fim, a inexistência de intenção de difamar, fato provado pela própria nota de desagravo e pelo fato de ter "ficado claro que as motivações principais do manifesto foram os problemas de estrutura do curso", segundo a própria comissão que instruiu o procedimento administrativo. Requereram seja julgado improcedente o pedido da autora, os benefícios da justiça gratuita, bem assim a condenação da requerente ao pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios. Acostaram aos autos os documentos de folhas 125-136.
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Em 14/12/2007, a autora ofereceu a réplica de fls. 140/143, repisando os argumentos já expendidos na exordial.
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Intimadas, as partes não requereram a produção de quaisquer provas.
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Em 26/03/2009, foi realizada a Audiência de Tentativa de Conciliação, que restou infrutífera, motivo pelo qual foi aberto prazo para memoriais.
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Alegações finais das partes autora e ré, respectivamente às fls. 152/153 e 156/158.
É o relatório.
Decido.
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Trata-se de pedido de indenização por danos morais ajuizado pela autora - professora universitária - em face de conduta dos réus - alunos - que a teriam agredido em sua integridade moral pelo modo como se manifestaram contra sua conduta acadêmica.
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Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao julgamento do feito.
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O fato é incontroverso. A contestação se limita a infirmar as alegações da autora de que o manifesto seria afrontoso a sua dignidade, de que haveria dano e intenção de difamar.
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Deve-se ressaltar que a presente ação não cuida de examinar se a autora é ou não boa profissional. Não é esse o punctum saliens. A questão é saber se, e em que extensão, houve dano moral decorrente de ato dos requeridos que, segundo a exordial, abusou do direito de liberdade de expressão.
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No presente caso, a alegação de afronta por parte da autora tem especial relevância na medida em que tanto os alunos quanto a professora estão inseridos em um meio profissional peculiar: a universidade.
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A universidade, diga-se de passagem, é uma comunidade que partilha determinados valores, próprios daqueles que exercem a atividade acadêmica. Em uma universidade, os alunos não são meros clientes, são partes constituintes da instituição. Para entender a diferença entre um aluno do sistema de ensino regular e o aluno de uma universidade devemos lembrar o significado dessa instituição.
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Como a própria palavra sugere, universidade (universitas) diz respeito a uma corporação de mestres e alunos. No início, tratava-se de uma simples associação de indivíduos; os alunos seguiam os mestres por todos os lugares e as aulas poderiam acontecer em qualquer lugar. Esse mestre não recebia salário. Poderia receber honorários de um patrono que financiava a sua cátedra, pagamento dos alunos sustentados por suas famílias, ou doações da população da urbe. Em sua origem, qualquer pessoa, independentemente de classe social, poderia ter acesso à universidade, como estudante ou professor, pois o saber era considerado um dom divino. Somente em um momento posterior, foram instituídas a Licentia Docendi (permissão para ensinar), concedida pela Igreja, e a prebenda, o salário para o mestre, que se tornava, a partir de então, funcionário eclesiástico ou principesco.
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Pois bem. Essa instituição milenar é, por definição, um sistema fechado, com regras próprias e formas particulares de ingresso. E esse é o motivo pelo qual o estudante universitário tem prerrogativas que lhe são inerentes, que o distinguem de um estudante secundarista. O aluno que, ao lado do mestre, constitui a universitas, tem direito a voto na eleição para reitor, representação no Conselho Universitário, representação no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão et cetera.
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Por exemplo, o art. 5.º do Regimento Interno da UnB dispõe que o Conselho Universitário é composto, dentre outros, "por representantes discentes, eleitos por seus pares, em número correspondente a 1/5 (um quinto) dos demais membros do Conselho, sendo 1/4 (um quarto) desta representação composta por alunos de pós-graduação" .
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O art. 9.º do mesmo regimento dispõe que os "representantes discentes, eleitos por seus pares, em número correspondente a 1/5 (um quinto) dos demais membros do Conselho, sendo 1/4 (um quarto) dessa representação composta por alunos de pós-graduação", terão assento no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
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Ora, quem tem assento nos principais conselhos da instituição tem os instrumentais necessários para pedir, perante a burocracia acadêmica, as melhorias necessárias ao incremento da qualidade de ensino. Poderiam, ainda, peticionar individualmente, perante a administração da universidade apontando os erros e exigindo soluções. De outro lado, tais direitos vêm acompanhados de responsabilidades quanto ao bom funcionamento da comunidade acadêmica.
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O Regimento Disciplinar da Universidade de Brasília, em seu art. 4.º, dispõe que são deveres dos membros da comunidade universitária o exercício de suas funções tendo em vista, além de outros, os princípios básicos de respeito à urbanidade acadêmica. O art. 13 do mesmo regimento prevê a pena de exclusão ao aluno que "caluniar, injuriar ou difamar membro da comunidade universitária", "desacatar membro dos corpos docente, discente, administrativo ou técnico", ou, ainda, "praticar, no exercício de suas atividades discentes ou em razão dela, ato incompatível com a condição de aluno".
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O que se deve concluir desse quadro é que o estudante universitário deve saber que fatos como os descritos na inicial e comprovados nos autos não se coadunam com os princípios que regem a relação entre alunos e mestres. Isso porque podem e devem exercer a sua legítima liberdade de expressão, mas sempre dentro dos limites impostos pelo ordenamento jurídico, sem atentarem contra a honra e a imagem de terceiros.
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Pois bem. O texto do manifesto, dentre outras considerações, afirma que a autora não conseguiu, durante o semestre letivo, dar aula sem o apoio de slides, a ponto de ser incapaz de responder dúvidas dos alunos fora dos assuntos apresentados no citado material didático. Asseverou, ainda, "que todos os seminários apresentados pelos alunos foram melhores do que a melhor aula dela". Concluiu da seguinte forma: "O pior é saber que ela é, supostamente, pois existem muitas dúvidas sobre a veracidade do fato, doutora no assunto e, pior ainda, é adjunta no quadro de professores da UnB. Que universidade é essa que tem no quadro de professores quase ignorantes no assunto ministrando aulas??? Pior, existe uma 'suposta' seleção de candidatos a vaga para professor adjunto. Mas quais foram os professores do quadro que aceitaram a prof. Mônica como nova adjunta ??? Será que a falta de profissionais capacitados é tão grande? Se na Faculdade de Medicina da UnB explodiu há pouco tempo um escândalo de compra de vagas na graduação, esperamos que não venha a tona um escândalo de venda de cargos de professor adjunto, ainda mais no departamento de Farmácia" (fl. 129). Por fim, questionaram o Coordenador de Graduação, que defendeu a autora, nos seguintes termos: "Pelas palavras dele, ele deve achar que somos o quê ??? Medíocres como ela, só pode !!!" (fl. 130).
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Do cotejo dos elementos de convicção que ilustram os autos infere-se que os requeridos, em uma manifestação dirigida à comunidade acadêmica, qualificaram a parte autora, professora da instituição, como "medíocre", palavra altamente depreciativa, pois serve para designar o mau profissional, aquele que exerce determinado ofício ou profissão sem ter o necessário preparo ou qualificação para tanto, exorbitando, assim, a liberdade de expressão constitucionalmente assegurada, com o objetivo de denegrir a imagem da professora (no mesmo sentido, mas em relação à palavra "picareta": ACJ n.º 2005.03.1.008841-6, 2.ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Relator Juiz JESUÍNO APARECIDO RISSATO).
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Ademais, o manifesto questionou a veracidade da titulação acadêmica da autora nos seguintes termos: "O pior é saber que ela é, supostamente, pois existem muitas dúvidas sobre a veracidade do fato, doutora no assunto e, pior ainda, é adjunta no quadro de professores da UnB." Ao mesmo tempo, levantou dúvidas sobre a lisura da seleção da professora, sugerindo que: "Pior, existe uma 'suposta' seleção de candidatos a vaga para professor adjunto. Mas quais foram os professores do quadro que aceitaram a prof. Mônica como nova adjunta ??? Será que a falta de profissionais capacitados é tão grande? Se na Faculdade de Medicina da UnB explodiu há pouco tempo um escândalo de compra de vagas na graduação, esperamos que não venha a tona um escândalo de venda de cargos de professor adjunto, ainda mais no departamento de Farmácia" (fl. 129).
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Além disso, a publicidade, que se deu na forma de exposição nos corredores da Faculdade, assinada por diversos alunos, é típica manifestação que afronta direitos da autora, pois lhe subtrai a faculdade de exercer o direito à defesa, inafastável, em regra, mesmo nas relações entre particulares. Caso os requeridos tivessem se utilizados das vias institucionais para exigir a melhoria da qualidade de ensino, a professora teria a oportunidade de apresentar sua defesa, além de não ficar exposta aos comentários de todos que se deparassem com o manifesto nos corredores do seu ambiente de trabalho.
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Estudantes desse nível, que desfrutam do privilégio de estudar em uma instituição de ensino superior pública, reputada como das melhores do país, alvo do desejo de quase todos os cidadãos, têm o legítimo interesse em exigir melhorias na qualidade de ensino e transparência da administração da universidade, mas não tem o direito de usar forma que agrida a honra de uma professora.
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Na hipótese em que tivessem representado perante a autoridade competente, apontando objetivamente fatos que considerassem incompatíveis com a rotina universitária, não haveria como lhes imputar qualquer ilicitude. Mas preferiram abusar do direito de crítica, expondo a professora e afrontando sua reputação profissional perante os seus pares e o restante da comunidade acadêmica.
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Por fim, deve-se sublinhar que o fato de os requeridos terem subscrito nota de desagravo não pode ter o condão de diminuir o estrago causado pelo referido manifesto, uma vez que não houve retratação quanto ao conteúdo da manifestação. Apenas se limitaram a admitir que exageraram na forma, mantendo tudo o mais que foi dito. Repito: os requeridos poderiam ter feito as mesmas críticas à professora, em termos respeitosos, pela via institucional, o que não foi feito. Portanto, é o caso de se acolher a pretensão da parte autora.
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No que tange ao valor da indenização, SERGIO CAVALIERI FILHO leciona que a indenização tem função pedagógica, litteris:
"(...) Com efeito, o ressarcimento do dano moral não tende à restitutio in integrum do dano causado, tendo mais uma genérica função satisfatória, com a qual se procura um bem que recompense, de certo modo, o sofrimento ou a humilhação sofrida. Substitui-se o conceito de equivalência, próprio do dano material, pelo de compensação, que se obtém atenuando, de maneira indireta, as conseqüências do sofrimento.
Em suma, a composição do dano moral realizas e através desse conceito - compensação -, que além de diverso do de ressarcimento, baseia-se naquilo que Ripert chamava 'substituição do prazer, que desaparece, por um novo'. Por outro lado, não se pode ignorar a necessidade de se impor uma pena ao causador do dano moral, para não passar impune a infração e, assim, estimular novas agressões. A indenização funcionará também como uma espécie de pena privada em benefício da vítima." (Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Malheiros, 6.ª ed., p. 103.)
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Nos autos do REsp n.º 355392/RJ, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça acentuou o aspecto pedagógico da condenação por dano moral:
"DANO MORAL. REPARAÇÃO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DO VALOR. CONDENAÇÃO ANTERIOR, EM QUANTIA MENOR.
Na fixação do valor da condenação por dano moral, deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível cultural do causador do dano; condição socioeconômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da culpa (se for o caso) do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo do ofendido e as repercussões do fato na comunidade em que vive a vítima.
Ademais, a reparação deve ter fim também pedagógico, de modo a desestimular a prática de outros ilícitos similares, sem que sirva, entretanto, a condenação de contributo a enriquecimentos injustificáveis.
Verificada condenação anterior, de outro órgão de imprensa, em quantia bem inferior, por fatos análogos, é lícito ao STJ conhecer do recurso pela alínea c do permissivo constitucional e reduzir o valor arbitrado a título de reparação. Recurso conhecido e, por maioria, provido." (DJ de 17/06/2002, p. 258.)
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Conforme acentuou o Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, nos autos do AgRg no Ag n.º 598700/SP, "a indenização por dano moral objetiva compensar a dor moral sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular este e a sociedade a cometerem atos dessa natureza" (DJ de 18/04/2005, p. 314).
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Assim, quanto ao valor da condenação por dano moral, visando compensar a autora, e observando o nível cultural e a condição socioeconômica dos requeridos, causadores do dano, bem assim a intensidade do dolo e os efeitos do dano no psiquismo da autora, ultrajada em seu local de trabalho e inferiorizada perante os seus pares na comunidade acadêmica, fixo, em R$ 12.000,00 (doze mil reais), o quantum a ser pago pelos requeridos a título de indenização por danos morais.
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Ante o exposto, julgo procedente o pedido para condenar os requeridos ao pagamento, em favor da autora, de R$ 12.000,00 (doze mil reais), à título de danos morais, atualizados monetariamente a partir da publicação da sentença. Arcarão os requeridos com as custas judiciais e os honorários advocatícios em favor da autora, os quais fixo em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3.º, do Código de Processo Civil. Deixo de deferir aos réus os benefícios da justiça gratuita, eis que não juntaram aos autos as declarações necessárias.
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Brasília - DF, quarta-feira, 16/12/2009 às 17h37.
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Catarina de Macedo Nogueira L. e Correa
Juíza de Direito Substituta
.Em 29/11/2005, a emenda foi acolhida, determinando-se, ainda, o trâmite do feito pelo rito comum sumário, a designação de data para a audiência prevista nos arts. 277 e 278 do CPC e a citação e intimação dos requeridos, nos termos da decisão de fl. 29.
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Tendo em vista a quantidade de réus, a audiência de conciliação foi cancelada e o rito transformado em ordinário. Foi, ainda, determinada a intimação dos réus citados para apresentação de resposta no prazo de 15 dias, nos termos da decisão de fl. 115.
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Em 17/10/2007, os requeridos apresentaram sua defesa, por meio da petição de fls. 118/124. Infirmaram a alegação da autora de que o manifesto seria afrontoso a sua dignidade, nos seguintes termos: "no manifesto, em nenhum momento foi tecido qualquer comentário à pessoa da Requerente Sra. Mônica Valério, mas sim sobre a didática, sobre os serviços prestados pela referida professora, estando os Requeridos na situação de consumidores dos serviços por ela prestados, tornam-se justos os comentários oferidos" (sic). Alegaram, ainda, que não foi apontado o dano, que seria futuro, segundo a própria inicial. Aduziram, por fim, a inexistência de intenção de difamar, fato provado pela própria nota de desagravo e pelo fato de ter "ficado claro que as motivações principais do manifesto foram os problemas de estrutura do curso", segundo a própria comissão que instruiu o procedimento administrativo. Requereram seja julgado improcedente o pedido da autora, os benefícios da justiça gratuita, bem assim a condenação da requerente ao pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios. Acostaram aos autos os documentos de folhas 125-136.
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Em 14/12/2007, a autora ofereceu a réplica de fls. 140/143, repisando os argumentos já expendidos na exordial.
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Intimadas, as partes não requereram a produção de quaisquer provas.
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Em 26/03/2009, foi realizada a Audiência de Tentativa de Conciliação, que restou infrutífera, motivo pelo qual foi aberto prazo para memoriais.
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Alegações finais das partes autora e ré, respectivamente às fls. 152/153 e 156/158.
É o relatório.
Decido.
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Trata-se de pedido de indenização por danos morais ajuizado pela autora - professora universitária - em face de conduta dos réus - alunos - que a teriam agredido em sua integridade moral pelo modo como se manifestaram contra sua conduta acadêmica.
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Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao julgamento do feito.
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O fato é incontroverso. A contestação se limita a infirmar as alegações da autora de que o manifesto seria afrontoso a sua dignidade, de que haveria dano e intenção de difamar.
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Deve-se ressaltar que a presente ação não cuida de examinar se a autora é ou não boa profissional. Não é esse o punctum saliens. A questão é saber se, e em que extensão, houve dano moral decorrente de ato dos requeridos que, segundo a exordial, abusou do direito de liberdade de expressão.
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No presente caso, a alegação de afronta por parte da autora tem especial relevância na medida em que tanto os alunos quanto a professora estão inseridos em um meio profissional peculiar: a universidade.
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A universidade, diga-se de passagem, é uma comunidade que partilha determinados valores, próprios daqueles que exercem a atividade acadêmica. Em uma universidade, os alunos não são meros clientes, são partes constituintes da instituição. Para entender a diferença entre um aluno do sistema de ensino regular e o aluno de uma universidade devemos lembrar o significado dessa instituição.
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Como a própria palavra sugere, universidade (universitas) diz respeito a uma corporação de mestres e alunos. No início, tratava-se de uma simples associação de indivíduos; os alunos seguiam os mestres por todos os lugares e as aulas poderiam acontecer em qualquer lugar. Esse mestre não recebia salário. Poderia receber honorários de um patrono que financiava a sua cátedra, pagamento dos alunos sustentados por suas famílias, ou doações da população da urbe. Em sua origem, qualquer pessoa, independentemente de classe social, poderia ter acesso à universidade, como estudante ou professor, pois o saber era considerado um dom divino. Somente em um momento posterior, foram instituídas a Licentia Docendi (permissão para ensinar), concedida pela Igreja, e a prebenda, o salário para o mestre, que se tornava, a partir de então, funcionário eclesiástico ou principesco.
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Pois bem. Essa instituição milenar é, por definição, um sistema fechado, com regras próprias e formas particulares de ingresso. E esse é o motivo pelo qual o estudante universitário tem prerrogativas que lhe são inerentes, que o distinguem de um estudante secundarista. O aluno que, ao lado do mestre, constitui a universitas, tem direito a voto na eleição para reitor, representação no Conselho Universitário, representação no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão et cetera.
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Por exemplo, o art. 5.º do Regimento Interno da UnB dispõe que o Conselho Universitário é composto, dentre outros, "por representantes discentes, eleitos por seus pares, em número correspondente a 1/5 (um quinto) dos demais membros do Conselho, sendo 1/4 (um quarto) desta representação composta por alunos de pós-graduação" .
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O art. 9.º do mesmo regimento dispõe que os "representantes discentes, eleitos por seus pares, em número correspondente a 1/5 (um quinto) dos demais membros do Conselho, sendo 1/4 (um quarto) dessa representação composta por alunos de pós-graduação", terão assento no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
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Ora, quem tem assento nos principais conselhos da instituição tem os instrumentais necessários para pedir, perante a burocracia acadêmica, as melhorias necessárias ao incremento da qualidade de ensino. Poderiam, ainda, peticionar individualmente, perante a administração da universidade apontando os erros e exigindo soluções. De outro lado, tais direitos vêm acompanhados de responsabilidades quanto ao bom funcionamento da comunidade acadêmica.
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O Regimento Disciplinar da Universidade de Brasília, em seu art. 4.º, dispõe que são deveres dos membros da comunidade universitária o exercício de suas funções tendo em vista, além de outros, os princípios básicos de respeito à urbanidade acadêmica. O art. 13 do mesmo regimento prevê a pena de exclusão ao aluno que "caluniar, injuriar ou difamar membro da comunidade universitária", "desacatar membro dos corpos docente, discente, administrativo ou técnico", ou, ainda, "praticar, no exercício de suas atividades discentes ou em razão dela, ato incompatível com a condição de aluno".
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O que se deve concluir desse quadro é que o estudante universitário deve saber que fatos como os descritos na inicial e comprovados nos autos não se coadunam com os princípios que regem a relação entre alunos e mestres. Isso porque podem e devem exercer a sua legítima liberdade de expressão, mas sempre dentro dos limites impostos pelo ordenamento jurídico, sem atentarem contra a honra e a imagem de terceiros.
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Pois bem. O texto do manifesto, dentre outras considerações, afirma que a autora não conseguiu, durante o semestre letivo, dar aula sem o apoio de slides, a ponto de ser incapaz de responder dúvidas dos alunos fora dos assuntos apresentados no citado material didático. Asseverou, ainda, "que todos os seminários apresentados pelos alunos foram melhores do que a melhor aula dela". Concluiu da seguinte forma: "O pior é saber que ela é, supostamente, pois existem muitas dúvidas sobre a veracidade do fato, doutora no assunto e, pior ainda, é adjunta no quadro de professores da UnB. Que universidade é essa que tem no quadro de professores quase ignorantes no assunto ministrando aulas??? Pior, existe uma 'suposta' seleção de candidatos a vaga para professor adjunto. Mas quais foram os professores do quadro que aceitaram a prof. Mônica como nova adjunta ??? Será que a falta de profissionais capacitados é tão grande? Se na Faculdade de Medicina da UnB explodiu há pouco tempo um escândalo de compra de vagas na graduação, esperamos que não venha a tona um escândalo de venda de cargos de professor adjunto, ainda mais no departamento de Farmácia" (fl. 129). Por fim, questionaram o Coordenador de Graduação, que defendeu a autora, nos seguintes termos: "Pelas palavras dele, ele deve achar que somos o quê ??? Medíocres como ela, só pode !!!" (fl. 130).
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Do cotejo dos elementos de convicção que ilustram os autos infere-se que os requeridos, em uma manifestação dirigida à comunidade acadêmica, qualificaram a parte autora, professora da instituição, como "medíocre", palavra altamente depreciativa, pois serve para designar o mau profissional, aquele que exerce determinado ofício ou profissão sem ter o necessário preparo ou qualificação para tanto, exorbitando, assim, a liberdade de expressão constitucionalmente assegurada, com o objetivo de denegrir a imagem da professora (no mesmo sentido, mas em relação à palavra "picareta": ACJ n.º 2005.03.1.008841-6, 2.ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Relator Juiz JESUÍNO APARECIDO RISSATO).
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Ademais, o manifesto questionou a veracidade da titulação acadêmica da autora nos seguintes termos: "O pior é saber que ela é, supostamente, pois existem muitas dúvidas sobre a veracidade do fato, doutora no assunto e, pior ainda, é adjunta no quadro de professores da UnB." Ao mesmo tempo, levantou dúvidas sobre a lisura da seleção da professora, sugerindo que: "Pior, existe uma 'suposta' seleção de candidatos a vaga para professor adjunto. Mas quais foram os professores do quadro que aceitaram a prof. Mônica como nova adjunta ??? Será que a falta de profissionais capacitados é tão grande? Se na Faculdade de Medicina da UnB explodiu há pouco tempo um escândalo de compra de vagas na graduação, esperamos que não venha a tona um escândalo de venda de cargos de professor adjunto, ainda mais no departamento de Farmácia" (fl. 129).
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Além disso, a publicidade, que se deu na forma de exposição nos corredores da Faculdade, assinada por diversos alunos, é típica manifestação que afronta direitos da autora, pois lhe subtrai a faculdade de exercer o direito à defesa, inafastável, em regra, mesmo nas relações entre particulares. Caso os requeridos tivessem se utilizados das vias institucionais para exigir a melhoria da qualidade de ensino, a professora teria a oportunidade de apresentar sua defesa, além de não ficar exposta aos comentários de todos que se deparassem com o manifesto nos corredores do seu ambiente de trabalho.
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Estudantes desse nível, que desfrutam do privilégio de estudar em uma instituição de ensino superior pública, reputada como das melhores do país, alvo do desejo de quase todos os cidadãos, têm o legítimo interesse em exigir melhorias na qualidade de ensino e transparência da administração da universidade, mas não tem o direito de usar forma que agrida a honra de uma professora.
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Na hipótese em que tivessem representado perante a autoridade competente, apontando objetivamente fatos que considerassem incompatíveis com a rotina universitária, não haveria como lhes imputar qualquer ilicitude. Mas preferiram abusar do direito de crítica, expondo a professora e afrontando sua reputação profissional perante os seus pares e o restante da comunidade acadêmica.
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Por fim, deve-se sublinhar que o fato de os requeridos terem subscrito nota de desagravo não pode ter o condão de diminuir o estrago causado pelo referido manifesto, uma vez que não houve retratação quanto ao conteúdo da manifestação. Apenas se limitaram a admitir que exageraram na forma, mantendo tudo o mais que foi dito. Repito: os requeridos poderiam ter feito as mesmas críticas à professora, em termos respeitosos, pela via institucional, o que não foi feito. Portanto, é o caso de se acolher a pretensão da parte autora.
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No que tange ao valor da indenização, SERGIO CAVALIERI FILHO leciona que a indenização tem função pedagógica, litteris:
"(...) Com efeito, o ressarcimento do dano moral não tende à restitutio in integrum do dano causado, tendo mais uma genérica função satisfatória, com a qual se procura um bem que recompense, de certo modo, o sofrimento ou a humilhação sofrida. Substitui-se o conceito de equivalência, próprio do dano material, pelo de compensação, que se obtém atenuando, de maneira indireta, as conseqüências do sofrimento.
Em suma, a composição do dano moral realizas e através desse conceito - compensação -, que além de diverso do de ressarcimento, baseia-se naquilo que Ripert chamava 'substituição do prazer, que desaparece, por um novo'. Por outro lado, não se pode ignorar a necessidade de se impor uma pena ao causador do dano moral, para não passar impune a infração e, assim, estimular novas agressões. A indenização funcionará também como uma espécie de pena privada em benefício da vítima." (Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Malheiros, 6.ª ed., p. 103.)
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Nos autos do REsp n.º 355392/RJ, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça acentuou o aspecto pedagógico da condenação por dano moral:
"DANO MORAL. REPARAÇÃO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DO VALOR. CONDENAÇÃO ANTERIOR, EM QUANTIA MENOR.
Na fixação do valor da condenação por dano moral, deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível cultural do causador do dano; condição socioeconômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da culpa (se for o caso) do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo do ofendido e as repercussões do fato na comunidade em que vive a vítima.
Ademais, a reparação deve ter fim também pedagógico, de modo a desestimular a prática de outros ilícitos similares, sem que sirva, entretanto, a condenação de contributo a enriquecimentos injustificáveis.
Verificada condenação anterior, de outro órgão de imprensa, em quantia bem inferior, por fatos análogos, é lícito ao STJ conhecer do recurso pela alínea c do permissivo constitucional e reduzir o valor arbitrado a título de reparação. Recurso conhecido e, por maioria, provido." (DJ de 17/06/2002, p. 258.)
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Conforme acentuou o Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, nos autos do AgRg no Ag n.º 598700/SP, "a indenização por dano moral objetiva compensar a dor moral sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular este e a sociedade a cometerem atos dessa natureza" (DJ de 18/04/2005, p. 314).
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Assim, quanto ao valor da condenação por dano moral, visando compensar a autora, e observando o nível cultural e a condição socioeconômica dos requeridos, causadores do dano, bem assim a intensidade do dolo e os efeitos do dano no psiquismo da autora, ultrajada em seu local de trabalho e inferiorizada perante os seus pares na comunidade acadêmica, fixo, em R$ 12.000,00 (doze mil reais), o quantum a ser pago pelos requeridos a título de indenização por danos morais.
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Ante o exposto, julgo procedente o pedido para condenar os requeridos ao pagamento, em favor da autora, de R$ 12.000,00 (doze mil reais), à título de danos morais, atualizados monetariamente a partir da publicação da sentença. Arcarão os requeridos com as custas judiciais e os honorários advocatícios em favor da autora, os quais fixo em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3.º, do Código de Processo Civil. Deixo de deferir aos réus os benefícios da justiça gratuita, eis que não juntaram aos autos as declarações necessárias.
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Brasília - DF, quarta-feira, 16/12/2009 às 17h37.
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Catarina de Macedo Nogueira L. e Correa
Juíza de Direito Substituta
LINK PARA O SITE DO TJDF COM A SENTENÇA - http://tjdf19.tjdft.jus.br/cgi-bin/tjcgi1?MGWLPN=SERVIDOR1&NXTPGM=tjhtml122&ORIGEM=INTER&CIRCUN=1&SEQAND=139&CDNUPROC=20050110725634
Um comentário:
EHEHEH
QUERO VER AGORA...
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