sábado, 23 de janeiro de 2010

Adoção de crianças do Haiti

Nos últimos dias temos sido bombardeados com um número imenso de fotos e vídeos a respeito da tragédia de proporções incalculáveis que atingiu a população do Haiti. Logicamente é quase impossível elencarmos quais as imagens que mais nos entristecem, mas se fosse possível, eu diria que são aquelas em que aparecem crianças abandonadas em abrigos em situação altamente precária, sem saber se seus pais e demais parentes estão vivos.
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Quem assistiu ontem ao concerto beneficente Hope for Haiti, que passou em vários canais de televisão fechada, aliás um belíssimo espetáculo com alguns artistas e performances de tirar o fôlego (como foi o caso do grande Stevie Wonder interpretando "Bridge Over Troubled Water", de Simon e Garfunkel) , não pode deixar de se emocionar com a situação desses pequenos seres, os quais ainda não possuem maturidade para tentar compreender o que ocorreu e qual o impacto desse evento em suas vidas futuras.
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Aliás, mal sabem ou querem saber o que signifique a palavra "futuro", só querem um abraço, seja da mãe, do pai, de um irmão, ou de qualquer pessoa que lhes remeta à sua família, um dos primeiros conceitos que aprendemos e que carregamos pelo resto de nossas vidas. Ver aquelas crianças desprovidas desse sentimento básico, é realmente de cortar o coração.
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Por conta desses sentimentos, que geralmente surgem em momentos de grande calamidade, segundo informa a Agência Brasil, a Embaixada do Haiti em Brasília já recebeu centenas de pedidos de brasileiros interessados em adotar crianças haitianas.
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Mas a situação não é tão simples. Em primeiro lugar, para que um processo de adoção seja iniciado é preciso uma negociação com o governo do Brasil. A informação é da adida cultural da embaixada, Norma Cooper. Ela lembrou que o Haiti sequer dispõe de aviões para o transporte das crianças, tampouco de pessoas para acompanhá-las na viagem. Ainda segundo Norma, a embaixada já deu início a conversações com o governo brasileiro e que os pais interessados em adotar crianças haitianas devem enviar um e-mail para a embaixada expressando o interesse. “Assim que tivermos uma resposta do governo brasileiro, enviaremos e-mails de volta.”
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Dia 19, informa a Agência de Notícias, a diretora executiva do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Ann Veneman, disse que a organização está muito preocupada com a situação das crianças no Haiti, pois muitas se encontram separadas dos seus pais. Mas ainda não se sabe o que realmente aconteceu com muitos destes adultos. A Unicef, a Cruz Vermelha e outras organizações internacionais já começaram o processo de registro de crianças desacompanhadas, que estão sendo encaminhadas para abrigos seguros. Ann ressaltou que a adoção internacional só é indicada em último caso. “Todos os esforços serão feitos para reunir as crianças com suas famílias. Só se isso for impossível, e após realização de triagem apropriada, alternativas permanentes, como a adoção, devem ser consideradas pelas autoridades competentes”, disse a diretora da Unicef.
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De acordo com a assistente social Marisa Moraes Muniz, do setor de Adoção Internacional do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, para processos de adoção internacional usa-se como referência legal a Convenção de Haia, de 1993. Ela explicou ainda que os interessados em adotar crianças estrangeiras devem procurar um organismo credenciado para fazer a habilitação internacional de adoção. Marisa alertou que o Haiti, no entanto, não é signatário da convenção. “O que faz com que a questão passe a ser diplomática e deva ser resolvida em um acordo entre os dois países”, esclareceu a assistente social.
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A Secretaria Especial dos Direitos Humanos, da Presidência da República, recebeu hoje da Secretaria-Geral da Conferência de Haia de Direito Privado Internacional uma nota para reforçar o que já é adotado de praxe: em caso de catástrofes ou guerras deve-se suspender os processos de adoção. A secretaria da Conferência de Haia ressaltou, ainda, que, nessas situações como a que vive o Haiti diante da tragédia de um terremoto de tamanha proporção, é grande o risco de adoções internacionais ilegais, irregulares, prematuras ou mal feitas. Outra ressalva feita é que mesmo que o Haiti seja signatário da Convenção de Haia de 1993, todos os Estados receptores devem aplicar esses padrões e salvaguardas. De acordo com a Secretaria dos Direitos Humanos, em nota divulgada na última segunda-feira (18), os organismos internacionais alertam que o deslocamento das crianças para outros países, ou sua colocação temporária em famílias substitutas, deve ser evitado por ser considerado traumático. Uma ruptura adicional àquela já sofrida por ocasião do desastre natural ou situação de calamidade pode aumentar o forte impacto psicológico vivenciado pela criança. Além disso, qualquer decisão sobre retirar a criança do país onde vive deve se basear em considerações sobre a segurança da própria criança e não deve ser confundida com um processo de adoção.
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Este blogueiro que vos escreve alerta também para o fato de a legislação brasileira atual priorizar a manutenção da criança em sua família natural, ou ampliada, e a seguir, a adoção de crianças por casais residentes no Brasil, sendo a adoção internacional por casais estrangeiros aplicável em último caso. Como as legislações dos países signatários da Convenção de Haia devem ser harmonizadas com o texto da própria Convenção, podemos concluir que deve-se, antes de mais nada, procurar verificar quais crianças haitianas realmente ficaram duplamente órfãs, ou seja perderam o pai e a mãe na tragédia. Em seguida, procurar manter as crianças no âmbito da sua família, seja com tios, avós ou outros parentes próximos. Após, verificar se existem casais haitianos aptos ou habilitados segundo a lei do país para a adoção destas crianças e, por último, ou seja, somente esgotadas as possibilidades anteriores, poderíamos considerar a hipótese de uma adoção internacional.
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As pessoas que querem realmente ajudar, portanto, não precisam necessariamente adotar crianças, mas sim, "adotar a causa", ou seja, enviar donativos, alimentos não perecíveis, roupas, enfim, o que for possível. Sem dúvida nenhuma a iniciativa de adotar é de uma nobreza altamente louvável, mas não é neste momento a solução mais efetiva, podendo ser até mesmo considerada um desrespeito ao já consagrado Princípio do Melhor Interesse da Criança.
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Fonte das entrevistas: http://www.nominuto.com.br/

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